“Golpe explícito”? Quando a narrativa vale mais que os fatos – Noticiário 24H

Nos últimos dias, uma sequência coordenada de matérias em grandes jornais brasileiros tenta vender a tese de que a ocupação da Câmara dos Deputados teria sido “um golpe explícito” contra a democracia. O roteiro é sempre o mesmo: manchetes alarmistas, fotos selecionadas para gerar comoção e adjetivos inflamados que mais parecem peça de marketing político do que jornalismo.

Mas a pergunta que não cala é: desde quando protesto, por mais turbulento que seja, se transforma automaticamente em “golpe de Estado”? A história recente mostra que invasões e ocupações de prédios públicos, inclusive do Congresso, não são novidade no Brasil. Greves, movimentos estudantis, sindicalistas e até grupos indígenas já tomaram o plenário em diferentes governos curiosamente, sem receber o mesmo rótulo dramático de “golpe”.

O próprio conceito de golpe, segundo a ciência política, envolve tomada de poder, ruptura institucional e controle efetivo do Estado nada disso ocorreu. Não houve destituição de governo, suspensão de Constituição, nem forças armadas no comando. Houve sim, um ato de protesto que pode ser enquadrado em crimes específicos, mas que está longe de se equiparar a quarteladas e juntas militares que já marcaram a história do país.

O mais curioso é ver colunistas e repórteres ignorarem a seletividade na aplicação dessa narrativa. Quando manifestantes de espectros políticos alinhados à esquerda invadiram o Congresso em 2013, ou quando sedes de ministérios foram depredadas durante protestos em Brasília, a cobertura foi branda e recheada de justificativas sobre “expressão popular legítima”. Já quando a insatisfação parte de opositores ao governo atual, o tom vira automaticamente apocalíptico.

A insistência em chamar tudo de “golpe” só banaliza o termo e desinforma a população. Golpe de verdade tem data, protagonistas armados e consequências institucionais concretas. Inflar manchetes com essa retórica pode até render cliques e alimentar bolhas políticas, mas não muda a realidade dos fatos.

Se o objetivo da imprensa é defender a democracia, deveria começar pela honestidade intelectual: chamar protesto de protesto, crime de crime, e golpe de golpe sem distorções seletivas.