A Autópsia do Socialismo Boliviano: Como a guerra de egos entre Evo e Arce entregou o poder à direita após 20 anos – Noticiário 24H
O ciclo de quase duas décadas de hegemonia da esquerda na Bolívia chegou a um fim melancólico e autodestrutivo neste domingo (17). As eleições gerais, que deveriam consolidar um legado, se transformaram no funeral político do Movimento ao Socialismo (MAS), um partido que não foi derrotado por seus adversários, mas implodido pela vaidade de seus próprios líderes. A vitória da direita, que agora se prepara para governar pela primeira vez desde 2006, é a consequência direta da guerra fratricida entre o ex-presidente Evo Morales e seu sucessor e pupilo, Luis Arce.
Os resultados das urnas, que apontam para um segundo turno entre dois candidatos de direita, Jorge “Tuto” Quiroga e Samuel Doria Medina, são menos uma celebração da força da oposição e mais um atestado da pulverização da esquerda. O MAS, que por anos foi uma máquina eleitoral imbatível, chegou às eleições esfacelado. De um lado, a ala de Arce, com o candidato governista Eduardo del Castillo, amargou um resultado pífio, reflexo de uma gestão marcada pela grave crise econômica, com inflação galopante e escassez de dólares e combustíveis.
Do outro lado, a ala radical de Evo Morales, após ser impedida pela Justiça de lançar o próprio ex-presidente, apostou suas fichas em Andrónico Rodríguez, que, embora tenha sido o candidato de esquerda mais bem votado, não conseguiu sequer chegar perto de forçar um segundo turno.
“A divisão drástica foi como uma pá de terra no caixão”, afirmou um analista político à imprensa local, resumindo o sentimento geral. A recusa de Morales em aceitar a perda de seu protagonismo e a incapacidade de Arce de construir uma base de poder independente criaram um racha insanável. Durante a campanha, a troca de acusações de “traição” e “corrupção” entre os dois campos foi mais feroz do que qualquer ataque vindo da direita, oferecendo ao eleitorado um espetáculo deprimente de canibalismo político.
Evo Morales, desvinculado do partido que fundou, chegou a fazer campanha pelo voto nulo, em um ato final de “se não for meu, não será de mais ninguém”. A estratégia, ao que parece, funcionou.
O que se viu na Bolívia não foi a derrota de um projeto, mas o fim de uma era, corroída pela arrogância e pela sede de poder de seus líderes. O socialismo do século XXI, que prometia um futuro de igualdade, sucumbiu ao mais antigo dos pecados políticos: a vaidade. A direita boliviana não precisou vencer a eleição; ela apenas sentou e assistiu ao suicídio de seu adversário.