O Bezerro Rejeitado: Como o mercado está transformando o ‘problema’ do gado leiteiro em uma nova fonte de carne – Noticiário 24H

Por décadas, a indústria de laticínios conviveu com um dilema ético e econômico silencioso: o que fazer com os bezerros machos? Em um sistema hiperespecializado, focado exclusivamente na produção de fêmeas para a ordenha, os machos nasciam como um subproduto indesejado, um “erro” genético com baixo valor de mercado, muitas vezes descartado ou vendido a preços irrisórios. Agora, em um movimento que é a mais pura expressão da lógica de mercado, criadores estão transformando este “problema” em uma solução, investindo na criação desses animais para a produção de carne.

Essa mudança de rota não é fruto de nenhuma política governamental ou de um comitê de planejamento central. É a resposta pragmática de produtores rurais a uma necessidade econômica, a prova de que a inovação floresce quando o empreendedor é livre para encontrar valor onde antes só havia custo.

A criação de um bezerro macho de raça leiteira (como a Holandesa) para o abate é um desafio. Diferente das raças de corte (como a Nelore ou a Angus), esses animais não foram geneticamente selecionados para o ganho de peso e a produção de músculo. No entanto, através da adaptação de técnicas, os criadores estão tornando o negócio viável.

As Diferenças na Criação: Adaptando para a Carne

A transformação do “bezerro leiteiro” em um animal de corte envolve uma mudança completa no manejo:

  1. Nutrição Intensiva: A dieta é o ponto-chave. Enquanto um bezerro de corte pode ser criado a pasto, o macho de raça leiteira exige uma nutrição muito mais rica e calórica desde o início para compensar sua genética e acelerar o ganho de peso.
  2. Castração: A castração dos machos é fundamental. Ela não apenas amansa o animal, facilitando o manejo, mas também melhora a qualidade da carcaça, resultando em uma carne mais macia e com melhor acabamento de gordura.
  3. Cruzamento Industrial: A estratégia mais eficiente tem sido o cruzamento de vacas leiteiras com touros de raças de corte, como o Angus. O resultado é um animal mestiço que herda a precocidade e a qualidade de carne do pai, tornando a engorda muito mais rentável.
  4. Tempo de Abate: Geralmente, esses animais são abatidos mais jovens, resultando em uma carne conhecida como “vitelo” ou “baby beef”, que é extremamente macia, de cor mais clara e com um sabor mais suave, atendendo a um nicho de mercado específico.

A Lição do Livre Mercado

O que este movimento nos ensina é que os problemas da economia raramente são resolvidos por decreto. A “questão do bezerro macho” foi um problema criado pela própria especialização da indústria, uma busca por eficiência que gerou uma externalidade negativa. A solução não veio de uma lei que proíbe o descarte, mas da liberdade dos produtores de inovar e de transformar um passivo em um ativo.

Ao encontrar um destino lucrativo para os bezerros machos, o mercado não apenas resolve um problema ético, mas também cria um novo produto, aumenta a eficiência da cadeia produtiva e gera mais riqueza. É a demonstração de que, sem as amarras da intervenção estatal, a iniciativa privada tem a capacidade de encontrar soluções sustentáveis e economicamente viáveis para os desafios mais complexos.