O Fantasma na Máquina: IA lança ‘álbum novo’ de cantora folk sem que ela soubesse, e expõe o futuro sombrio da arte – Noticiário 24H

Em um episódio que parece saído de um roteiro distópico de “Black Mirror”, a cantora folk independente Patsy Decline descobriu, da pior maneira possível, que havia “lançado” um novo álbum. A coleção de nove músicas, disponível nas maiores plataformas de streaming do mundo, como Spotify e Apple Music, tinha sua foto na capa e seu nome nos créditos. O único problema: ela nunca gravou, escreveu ou sequer ouviu nenhuma das faixas. O álbum era uma fraude completa, gerado inteiramente por inteligência artificial a partir de sua voz e de seu estilo.

O caso não é apenas uma bizarra anedota tecnológica; é a materialização do pesadelo de todo artista e a prova cabal da anarquia irresponsável que reina no Vale do Silício. É a demonstração de que, na era da IA, sua identidade, sua arte e o trabalho de uma vida inteira podem ser roubados, replicados e monetizados por um anônimo qualquer, com a total cumplicidade das maiores empresas de tecnologia do mundo.

O que aconteceu com Patsy Decline é a violação definitiva da propriedade intelectual. Não se trata de um plágio ou de um sample não autorizado. Trata-se da criação de um “duplo digital”, um fantasma na máquina capaz de imitar sua arte de forma tão convincente que é distribuído globalmente como se fosse original. A IA não apenas copiou seu trabalho; ela roubou sua essência criativa para gerar um produto falsificado.

A Cumplicidade das Big Techs

A questão mais grave, no entanto, é a cumplicidade das plataformas de streaming. Como é possível que empresas como o Spotify e a Apple, que controlam o mercado global de música e faturam bilhões, não possuam o mais rudimentar dos sistemas de verificação para impedir que um álbum completamente fraudulento seja “lançado” em nome de um artista?

A resposta é simples e assustadora: para elas, não faz diferença. Em um modelo de negócios baseado no volume e no engajamento, a autenticidade é irrelevante. É a mesma lógica que permite a proliferação de fake news, de golpes e de conteúdo extremista. A prioridade não é a curadoria ou a proteção do artista, mas a manutenção de um fluxo interminável de “conteúdo” para manter o usuário na plataforma. A mesma empresa que emprega exércitos de censores para policiar opiniões políticas se mostra completamente incompetente para verificar se um álbum é real ou se foi gerado por um robô.

O caso de Patsy Decline é um alerta para todos os criadores. Ele expõe um futuro onde a linha entre o humano e a máquina se apaga, onde a originalidade pode ser industrializada e onde a identidade de um artista pode ser sequestrada por qualquer um com acesso a um software.

Enquanto a cantora luta para remover o “álbum fantasma” de circulação, a lição que fica é a de que a revolução da IA, sem um arcabouço ético e de responsabilidade, não será uma utopia de criatividade amplificada, mas um mercado negro de identidades roubadas, com as Big Techs como as grandes e coniventes agenciadoras.