A Fraude da ‘Farinha da Felicidade’: Como a indústria do ‘bem-estar’ vende pó de serra a preço de ouro e explora a esperança dos aflitos – Noticiário 24H
Em um país onde a educação nutricional é precária e a busca pelo emagrecimento rápido é uma obsessão nacional, a ascensão da “farinha da felicidade” era inevitável. Vendida em lojas de produtos naturais e promovida por influenciadores como a solução milagrosa para a perda de peso, o mau humor e a “desinflamação”, esta mistura de fibras e sementes é o mais recente e perfeito exemplo de como a indústria do “bem-estar” explora a esperança e a desinformação para vender, na prática, pó de serra a preço de ouro.
A promessa é sedutora: uma colher por dia para resolver todos os seus problemas. A composição, geralmente uma mistura de farinhas de aveia, banana verde, fibra de maçã, gérmen de trigo e gergelim, não tem nada de revolucionário. São ingredientes saudáveis, ricos em fibras, que podem, de fato, auxiliar no funcionamento do intestino e na sensação de saciedade. O problema não está nos ingredientes, mas na mentira que se constrói em torno deles.
A narrativa da “farinha da felicidade” é um ataque à lógica e à ciência. Nenhum alimento, por mais nutritivo que seja, pode “acelerar o metabolismo” ou “promover emagrecimento fácil e rápido”. A perda de peso sustentável é, e sempre será, o resultado de um princípio matemático simples e inegociável: o déficit calórico, ou seja, gastar mais energia do que se consome. Qualquer promessa que ignore essa lei fundamental é charlatanismo.
Nutricionistas e especialistas em saúde, que são convenientemente ignorados neste debate, alertam: não existe milagre. “A mistura pode ser um coadjuvante útil, mas não substitui refeição, nem dispensa atividade física ou orientação profissional”, afirma a nutricionista Michelle Lucas em reportagem da revista Ana Maria. O que a “farinha da felicidade” oferece, na melhor das hipóteses, é um efeito placebo e um aumento na ingestão de fibras — algo que poderia ser alcançado de forma muito mais barata comendo uma simples maçã ou uma porção de feijão.
Além da ineficácia para o emagrecimento milagroso, o consumo indiscriminado dessa mistura pode trazer riscos. O excesso de fibras sem a hidratação adequada pode causar desconforto intestinal, gases e até constipação. Ingredientes como o gérmen de trigo contêm glúten, um problema para celíacos, e outros, como a chia e a beterraba (presentes em algumas versões), são ricos em oxalatos, que podem favorecer a formação de cálculos renais em pessoas predispostas.
A popularidade da “farinha da felicidade” é um sintoma de uma sociedade doente, que busca em pós mágicos a solução para problemas complexos que exigem disciplina, esforço e, acima de tudo, responsabilidade individual. A indústria do “bem-estar”, ciente desse desespero, continuará a inventar novas misturas e novos nomes para vender o mesmo produto de sempre: a ilusão de um atalho que não existe.