Decisão de Moraes impõe prisão domiciliar a Bolsonaro e reacende debate sobre abuso de autoridade e violação de garantias constitucionais – Noticiário 24H

A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que impôs prisão domiciliar integral ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), volta a colocar em xeque os limites legais e constitucionais do poder judiciário no Brasil. Sob a justificativa de descumprimento de medidas cautelares, Moraes ordenou restrições que incluem proibição total de uso de redes sociais, visitas limitadas, bloqueio de comunicação com terceiros e até busca e apreensão de celulares. A medida, no entanto, gera fortes críticas de juristas e constitucionalistas, que enxergam nela uma afronta ao devido processo legal e às garantias fundamentais.

A base da decisão estaria no suposto uso indireto de perfis nas redes sociais por meio de filhos e aliados, o que, segundo Moraes, violaria as medidas cautelares anteriores. A nova ordem amplia as restrições, apesar de o próprio Código de Processo Penal (CPP), em seu artigo 282, §6º, afirmar:

“As medidas cautelares devem ser aplicadas de forma proporcional à gravidade do fato, adequadas à infração e às circunstâncias do caso.”

Juristas apontam que não há prova concreta de que Bolsonaro tenha dado ordens diretas ou coordenado publicações de terceiros, e que restringi-lo com base em ações de outros fere o princípio da responsabilidade penal individual, previsto no artigo 5º, inciso XLV da Constituição Federal:

“Nenhuma pena passará da pessoa do condenado.”

Além disso, o artigo 5º, inciso LIV da Constituição garante:

“Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.”

E o inciso LV reforça:

“Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”

A escalada de medidas excepcionais sem julgamento definitivo

Especialistas afirmam que medidas cautelares como essa, aplicadas repetidamente sem condenação formal, evidenciam um uso político do poder judicial, o que contraria a função garantista do STF. Ainda mais preocupante é a ameaça explícita de conversão da prisão domiciliar em prisão preventiva caso haja novo “descumprimento”. Isso mesmo quando a fundamentação apresentada por Moraes carece de elementos objetivos e dá margem a interpretações elásticas.

“A Justiça não permitirá que um réu a faça de tola, achando que ficará impune por ter poder político e econômico”, escreveu o ministro, em tom mais político que técnico.

A frase — repetida como bordão — levanta o debate sobre o uso de decisões judiciais com linguagem de advertência e caráter pedagógico, algo incomum em democracias constitucionais. Há quem diga que o ministro tem atuado não como julgador imparcial, mas como ator central em uma cruzada moral com tintas ideológicas.

A questão do uso de redes sociais: liberdade de expressão ou pretexto para censura?

A proibição do uso de redes sociais — mesmo por terceiros — acende outro alerta: o cerceamento indireto da liberdade de expressão, garantida no artigo 5º, inciso IX da Constituição:

“É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.”

Ao atribuir responsabilidade a Bolsonaro por publicações feitas por outras pessoas — mesmo que sejam seus filhos — Moraes rompe com o princípio da presunção de inocência, uma das pedras angulares do Estado de Direito.

O artigo 312 do CPP, que trata da prisão preventiva, deixa claro que tal medida deve ser aplicada para garantir a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, mas sempre de forma motivada e restrita. No caso em questão, não há condenação ou risco iminente apontado de forma objetiva que justifique o encarceramento — ainda que domiciliar.

Quando o juiz vira parte do jogo

O caso reforça uma preocupação crescente entre constitucionalistas: a hipertrofia do poder de um único ministro, que acumula investigação, julgamento, execução de medidas e decisões monocráticas com escassa ou nula revisão colegiada. Isso fere o artigo 2º da Constituição, que estabelece a separação entre os Poderes da República e o equilíbrio institucional.

Em nome de combater “ameaças à democracia”, cresce o temor de que o Judiciário esteja promovendo uma nova forma de autoritarismo: o judicial.