Reversão de Procedimentos Estéticos Ganha Força no Brasil e no Mundo – Noticiário 24H

A busca pelo corpo ideal, que impulsionou a popularização de procedimentos como preenchimentos faciais e implantes de silicone, começa a dar lugar a um novo movimento: o retorno ao natural. Um número crescente de pessoas — incluindo celebridades e influenciadores — tem procurado desfazer as modificações estéticas feitas nos últimos anos. O motivo? Insatisfação com os resultados, reações adversas e um questionamento mais profundo sobre os padrões de beleza.

No Brasil, os dados acompanham a tendência. De acordo com a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética, o número de remoções de próteses mamárias mais que dobrou entre 2019 e 2023, passando de 19.355 para 41.314 procedimentos. Lá fora, o movimento também se intensifica. No Reino Unido, a Associação Britânica de Cirurgiões Plásticos Estéticos registrou uma queda de 27% na procura por preenchimentos faciais em 2023. Nos Estados Unidos, a Academia Americana de Cirurgia Plástica Facial detectou uma redução de 14% nas aplicações em 2022 em relação ao ano anterior, enquanto a Sociedade Americana de Cirurgia Plástica Estética apontou um aumento de 57% na procura por dissoluções desses procedimentos entre 2020 e 2021.

Mesmo sem estatísticas oficiais no Brasil sobre reversões estéticas faciais, dermatologistas e cirurgiões relatam um aumento expressivo na procura. Segundo Daniel Coimbra, da Sociedade Brasileira de Dermatologia, a maior parte dos casos envolve preenchimentos de ácido hialurônico aplicados sem critério técnico, em locais incorretos ou por profissionais não qualificados. Regiões como lábios, olheiras e mandíbula concentram a demanda por dissolução com hialuronidase, enzima que quebra o ácido hialurônico.

Muitos pacientes relatam que os procedimentos — antes vendidos como promessas de “harmonização facial” — acabam, ironicamente, deformando os traços e distanciando a imagem no espelho da identidade que tinham de si mesmos. De acordo com o cirurgião plástico Murillo Fraga, do Hospital Israelita Albert Einstein, os pacientes que mais buscam a reversão têm entre 40 e 55 anos e se sentem desconectados da própria aparência após sucessivas intervenções não cirúrgicas.

Além do aspecto estético, há riscos à saúde. Edemas crônicos, nódulos e inflamações são consequências relatadas, principalmente quando substâncias permanentes, como PMMA e silicone, foram utilizadas. Nesses casos, a reversão total muitas vezes não é possível, pois os materiais se misturam aos tecidos. O uso crescente de bioestimuladores também tem provocado reações que exigem tratamento cirúrgico.

As próteses mamárias também entram nesse cenário. Entre os motivos que levam à retirada estão complicações como contratura capsular, ruptura e a chamada síndrome autoimune induzida por adjuvantes (ASIA), apelidada de “doença do silicone”, associada a sintomas como dores musculares, fadiga, ansiedade e inflamações crônicas.

Do ponto de vista psicológico, a reversão muitas vezes está ligada à sensação de arrependimento ou ao sentimento de não reconhecimento. Para a psicóloga clínica Rogéria Taragano, do Hospital das Clínicas da USP, o incômodo pode ser apenas estético, mas também pode indicar transtornos mais profundos, como o transtorno dismórfico corporal (TDC), condição marcada por uma percepção distorcida da própria imagem. Segundo uma meta-análise publicada na Revista Brasileira de Cirurgia Plástica, cerca de 12,5% dos pacientes de clínicas estéticas apresentam o transtorno — número seis vezes maior que o da população geral.

A influência das redes sociais e dos filtros digitais, que promovem padrões irreais e inalcançáveis, também é apontada como fator agravante. A exposição contínua a imagens modificadas digitalmente tem gerado uma onda de insatisfação corporal, especialmente entre os mais jovens.

Reverter esses procedimentos, no entanto, não é tarefa simples. Muitas vezes, os pacientes não sabem qual substância foi usada, nem a quantidade ou a profundidade da aplicação. Em casos de preenchimentos mal feitos, podem surgir fibroses e assimetrias difíceis de corrigir. Mesmo o ácido hialurônico, que é teoricamente reversível, pode exigir várias sessões para ser totalmente dissolvido — e nem sempre é possível recuperar a aparência original.

Há também uma questão ética envolvida. Para os especialistas, cabe ao profissional de saúde orientar com clareza, recusar intervenções desnecessárias e estar atento a sinais de desequilíbrio emocional. O bom profissional não realiza o que o paciente “pede”; propõe o que o paciente realmente precisa — com responsabilidade técnica e sensibilidade humana.

No Brasil, a multiplicidade de categorias autorizadas a aplicar substâncias como ácido hialurônico e toxina botulínica amplia o acesso, mas também dificulta o controle de qualidade e segurança. O cenário exige, mais do que nunca, informação, formação técnica e ética profissional.